Com raízes em uma pequena mercearia situada na esquina da Maria Antonia com a Dr. Vila Nova, em São Paulo, o Bar do Zé marcou época.
A rua ficou famosa nacionalmente a partir de 1968, quando aconteceu ali a triste “Guerra da Maria Antonia”, onde alunos do Mackenzie e da Faculdade de Filosofia da USP, instituições que ficavam uma defronte a outra, se enfrentaram a tiros. Ouve uma morte e diversos feridos, com o prédio da USP tendo sido incendiado e a faculdade sendo obrigada a mudar-se.
O Bar do Zé, cujo nome oficial era “Bar e Lanches Faculdade” ficou famoso, entre outras coisas, pelos seus sanduíches. O de pernil era uma delícia e os boêmios tradicionais do bar nunca eram incomodados pelo Zé ou pelos garçons – lembro-me bem do Arlindo, do Odair e do Alex.
Tinha uma frequência interessante: de manhã, bem cedo, estudantes do Mackenzie (inclusive do ensino médio) tomavam café da manhã. Logo depois deles, chegavam os funcionários do Sesc, Senac e outras instituições da região, também para o café da manhã.
Na hora do almoço, gente de toda espécie, almoçando ou comendo sanduíches. Ao final da tarde, estudantes já tomavam uma cervejinha. No início da noite, os mesmos trabalhadores citados acima iam bebericar também.
Logo após chegavam estudantes dos cursos noturnos, que matavam as aulas seguidos dos frequentadores tradicionais. Após o final das aulas, muitos professores do Mackenzie – meu marido inclusive, que era chamado pelos garçons de “professor”, e eu de “professora”.
Era um lugar onde se ficava à vontade – eu gosto de tirar os sapatos, e ali inclusive podia colocar meus pés em uma cadeira, ao final da noite. Quando preciso, era possível pendurar a conta ou descontar um cheque.
O Zé era também a sede do Unidos da Maria Antonia, um bloco que se reunia na tarde do sábado de carnaval. O Unidos talvez fosse o único bloco que desfilava parado: a rua era fechada, um trio elétrico estacionava em frente ao Zé e a cerveja rolava até tarde da noite.
O Bloco foi fundado em 1989 pelo Midnight (foto ao lado), o João Carlos Nascimento, um dos mais famosos frequentadores do Zé e que morreu em 2017 - vale a pena registrar que o Midnight quando me cumprimentava, beijava minha mão; bem à moda antiga.
O cronista Mario Prata, que frequentava o Zé, escreveu uma bela crônica sobre o bar que foi frequentado também por figuras como Delfim Neto, Fernando Henrique Cardoso, José Dirceu, Chico Buarque, Carlos Lyra, Toquinho e outros.
O dono do bar era o Zé Rodrigues, um português que acabou arrendando a casa para outro patrício, natural da ilha da Madeira – ele não foi feliz na administração e a chegada da pandemia acabou liquidando o Bar.
O prédio foi reformado, tendo se instalado ali um outro estabelecimento, muito chique, sem o espírito boêmio do Zé, mas que parece não ter caído no gosto do pessoal da região, vive sempre praticamente vazio.
Hoje, meu bar na Maria Antonia é o MacFil, onde a alegria dos estudantes, a gentileza dos garçons e a cerveja, estupidamente gelada, ao menos lembram o Bar do Zé, o último boteco raiz da rua Maria Antonia.
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